"A política da forma como está, não me permitirá grandes feitos"  

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Vereadora Carolina Pontes faz balanço de seu mandato e comenta a razão de não tentar a reeleição em novembro

 

 

Enquanto a maior parte dos vereadores se prepara para uma nova corrida eleitoral em novembro, Carolina Pontes (PSDB) anunciou que não participará do novo pleito. Após o primeiro mandato, a parlamentar faz o balanço de seu trabalho, cita os pontos positivos e as frustrações que viveu ao longo dos quatro anos de vereança.

"Optei anunciar minha opção pelo afastamento da corrida eleitoral. Infelizmente, a política, da forma como está, não me permitirá grandes feitos pela minha cidade. Estive à beira de sérios problemas de saúde por perseguições inimagináveis dentro dessa estrutura", cita.

Carolina é advogada, MBA em Administração Pública e Gestão de Cidades, pós-graduada em Direito Público, mestre em Direitos Fundamentais, Difusos e Coletivos pela Universidade Metodista de Piracicaba (UNIMEP) e doutoranda em Direito Político e Econômico pela Universidade Presbiteriana Mackenzie (UPM). A vivência na política, desde a juventude até os bastidores políticos, não tornaram o caminho mais fácil. Para ela, a experiência de um mandato daria uma narrativa literária. "O ambiente é inóspito e hostil".

Outro ponto enfrentado, menciona, foi o machismo. "Quando um homem altera a voz, ele é firme, quando a mulher age da mesma forma, ela está desequilibrada por melhores e mais sólidos que sejam seus argumentos".

 

 

Quais os principais aprendizados nesta primeira experiência de vereança?

Uma vida inteira em quatro anos. Por maior que seja sua vivência de bastidores e por mais mergulhada que esteja nos movimentos políticos, um cargo eletivo lhe torna uma pessoa legitimada para representar os anseios da população e nada substitui isso. Só que, infelizmente, a teia que tem por trás daquilo que é apresentado para a sociedade é muito maior e mais complexa. A experiência de um mandato daria uma narrativa literária. O ambiente é inóspito e hostil. As maiores traições já sofridas em minha vida aconteceram no ambiente político, assim como as maiores dores e frustrações já provadas. Por melhores que sejam suas intenções, você será julgado. Por mais conscientes que sejam seus atos, uma parcela da população vai nivelá-lo ao juízo do senso comum. E por mais segura que esteja, a exposição do cargo lhe fará ser admirada por alguns e odiada por outros.

 

Qual o balanço faz do seu mandato?

Mantive-me firme aos meus valores, mas carrego arrependimentos. Logo que fui eleita, fui entrevistada pela Gazeta e dentre os meus compromissos, assumi não ter indicações políticas ao Poder Executivo e assim me mantive. Parece algo simplista, mas dizer que você está isento no momento das votações de pautas governamentais quando seus principais apoiadores políticos estão empregados com altos salários na Prefeitura é hipocrisia. Sempre lutei contra isso e nunca adotei essas práticas, em que pese há quem defenda que essa postura seja legítima – na minha opinião não é. Votei em pautas governamentais, entretanto, todas as vezes que isso aconteceu foram por genuína convicção. A harmonia institucional é essencial no modelo tripartite do poder, mas há que se manter uma distância, pois não é natural que o prefeito se reúna de forma periódica com aqueles a quem têm dever de ofício de fiscalizá-lo. Pensei que fosse possível aproveitar mais as Comissões, mas, infelizmente, até a sua composição é estudada para trabalhar em prol do Poder Executivo. Não votei uma pauta sequer sem ter me debruçado nos trabalhos. Foi um mandato positivo, porém a conjuntura e o fato de eu ser da oposição não permitiram que fosse melhor.

 

O machismo também está presente na política? Como foi sua experiência neste sentido?

Principalmente na política, pois o parlamento representa aquilo que está presente na sociedade e é inegável que ela é essencialmente machista. Quando um homem altera a voz, ele é firme, quando a mulher age da mesma forma, ela está desequilibrada por melhores e mais sólidos que sejam seus argumentos. O próprio presidente da Câmara chegou a se referir a mim dessa forma em programa de rádio local. Sou mulher e a mais jovem vereadora dessa legislatura. Sofri diversos ataques de conotação sexual envolvendo meu nome em razão do exercício de meu trabalho. Não recebi apoio do meu partido na esfera local, ao contrário, tive a situação ainda mais explorada por estes que tentaram me perturbar para que eu deixasse a legenda. A mulher quando se destaca por sua inteligência e competência incomoda aqueles que temem perder o poder.

 

Acredita que é difícil o surgimento de novas lideranças na política? Por que isso ocorre?

Muito difícil. As pessoas que ingressam nesse meio por ideais são cerceadas logo no início. Vejo o exemplo da última Câmara Júnior em que os vereadores que protegem o prefeito ficavam preocupados com o que nossos jovens levantariam em plenário. Sob o escopo de proteger a imagem e o emocional de nossos jovens, já tinha parlamentar cogitando até em cessar a transmissão das sessões nas redes sociais, onde é o meio de muitos de nossos jovens se expressarem. Dava gosto de ouvir falas carregadas de ideais e críticas que muitos de meus pares pareciam fechar os olhos. Por outro lado, temos pessoas que se valem do discurso de renovação e sempre estiveram alinhados ao poder do modo que o sistema está posto. Vejo algumas pessoas dessa nova leva que já entram contaminadas sem a mínima vontade de mudar, apenas dando vazão às suas vaidades. Isso me entristece. Pela descrença na política e pelo fortalecimento da máxima que “gente de caráter não fica nesse meio”, pessoas bem-intencionadas - de fato - não se animam. Alguns jovens que se inspiravam em mim dizem: “Entrar para quê? Estamos acompanhando o que tentam fazer com você a cada vez que tenta fazer algo diferente.... por qual razão nos motivamos a enfrentar esse desgaste?”. Então, infelizmente, não vivemos apenas uma crise de instituições, mas de lideranças políticas e, sobretudo, uma crise de ideais.

 

Como podemos reverter isso?

Investimento sério e imparcial em Educação Política. Outro assunto que precisa estar em pauta: as pessoas precisam buscar identidade partidária para estarem no centro das discussões onde grande parte das questões são resolvidas. Não adianta a pessoa querer discutir política fora de um partido, quando é por meio dele que se pode tentar mudar alguma coisa. E, infelizmente, os partidos têm um poder que a sociedade, de um modo geral, desconhece. A estrutura é complexa e a dinâmica é complicada até para aqueles que conhecem muito bem a política de votos. Os partidos têm seus caciques, sim. A política partidária, quando feita de forma antiética, é o primeiro entrave daquele que quer mudar alguma coisa. Sempre fiquei muito concentrada em Limeira e cheguei a ficar frustrada por um período, pensando que era um problema concentrado de nossa cidade. Quando fui estudar meu doutorado em Direito Político e Econômico em São Paulo, conheci colegas de diversas esferas de atuação jurídica e política de toda parte do país e os problemas passam a ser nosso objeto de estudo. Esses problemas se repetem em todos os cantos do país e a reversão do quadro está bem longe de acontecer.

 

Você pretende tentar o segundo mandato? Se não, qual a razão?

Não, ao menos não agora. Hoje, 06 de setembro, está acontecendo a Convenção do PSDB, onde eu deveria submeter meu nome para o pleito de 2020 caso fosse tentar a reeleição, mas optei anunciar minha opção pelo afastamento da corrida eleitoral. Infelizmente, a política da forma como está, não me permitirá grandes feitos pela minha cidade. Estive à beira de sérios problemas de saúde por perseguições inimagináveis dentro dessa estrutura toda narrada. Você não precisa ser um grande revolucionário para incomodar, basta que não se silencie e decida não fazer “vista grossa” para as diversas tramitações, que você já passa ser o algoz de alguém nessa estrutura toda. A alternância de poder é salutar para democracia e acho que posso contribuir nas minhas três esferas de atuação – política, jurídica e acadêmica – independente de cargos e funções. Não sou escrava do poder, tampouco, faço da política uma profissão, pois acredito que quando você escolhe trilhar por esse caminho, fará tudo para “não perder o seu emprego” – e eu não estou disposta a fazer de tudo. 

 

O vereador é tido como uma das figuras públicas mais próximas da população, por outro lado, muitos desconhecem que a atuação pode ser limitada. Como equilibrar isso e fazer um bom trabalho?

Parece um mantra, mas novamente tenho que dizer que a saída é a Educação Política. O munícipe, quando vai até o seu gabinete pedir uma vaga de creche para o seu filho, não sabe que o vereador tem que lutar para que nenhuma mãe tenha que passar por isso. Ela não acha que faz errado ao pedir algum favorecimento e isso porque na forma como a política acontece, o vereador passa a ser mero braço do Executivo. A dinâmica não é para ser assim, mas é um raciocínio muito simplista “culpar o povo”, quando todos os mecanismos para que ele não tivesse acesso à Educação já foram usados. Essa equação é complicada. Uma gestão que gasta mais de 10 milhões em subsídio e renega as prioridades do seu povo, nunca permitirá que a mãe deixe de frequentar o gabinete para pedir escola para o filho, pois a vaga em creche sempre estará em falta.

 

Qual a importância do projeto vereador júnior? Como foi sua experiência por ele?

Eu sou fruto desse projeto que virou uma das leis que mais defendo em nossa cidade, de autoria do Dr. Júlio em um de seus mandatos como vereador. Pela Câmara Júnior, se nenhuma vocação for despertada, ao menos uma criança/adolescente sai de lá com o início de sua construção de conhecimento político. Eu tenho um tremendo orgulho de ter pertencido ao primeiro ano dessa experiência e ter me tornado a primeira vereadora titular após essa experiência, quase 20 anos mais tarde. Eis a prova de que trabalhar com Cidadania e Educação Política leva tempo, mas é o principal mecanismo de transformação de gerações. Infelizmente sua visibilidade ainda é muito tímida mesmo existindo por mais de duas décadas e há quem tema os desdobramentos de um programa tão ousado e necessário como esse. Foi uma das melhores experiências que vivenciei. É a manifestação genuína dos ideais de um jovem que quer mudar o mundo; o grande problema está em não fazer esse jovem deixar de acreditar nessa possibilidade diante do mundo revelado durante o seu crescimento.

 

Acredita que esse seja um caminho para atrair os mais jovens para o cenário político?

É uma das ferramentas, mas precisa ser conduzida de modo a assegurar a liberdade de participação e atuação dos jovens. Nessa última experiência, muitos vinham me procurar desolados por serem cerceados. Mutilar sonhos deveria ser tipificado como crime em nosso ordenamento jurídico brasileiro. É um caminho, mas não é o único. Tenho uma Resolução aprovada na Câmara que fomenta a participação do jovem na política que nunca foi colocada em prática de maneira efetiva. Temos uma Escola Legislativa que poderia ser muito mais bem utilizada. Seus recursos financeiros são usados para produzir folhetos informativos e aperfeiçoamento para os servidores comissionados da Casa, quando poderiam promover muito mais debates, trazendo a população para Câmara ou descentralizando seus trabalhos para a área periférica, mas, infelizmente, na primeira reestruturação administrativa, a presidência da Casa cortou o/a cargo/função justamente da Escola Legislativa, sob o argumento de uma falsa economia do erário público – falsa, pois o dinheiro passa a ser devolvido ao Executivo ao invés de ser revertido em prestação de serviços à Comunidade.

 

O que não foi perguntado, mas que considera pertinente acrescentar?

Não há perguntas ou respostas, mas gostaria de deixar aqui o meu registro de agradecimento para cada um que me acompanhou neste mandato. Cada gesto, fala, apoio, incentivo, sobretudo, confiança, foram indispensáveis para que eu pudesse atravessá-lo e concluí-lo. Família, amigos e o manifesto da população foram essenciais para que eu me mantivesse firme. Para uma legislatura que teve até vereador cassado por ter exercido sua função fiscalizatória, eu me considero uma vitoriosa em não sair ainda mais machucada. No meu partido, PSDB, agradeço a guarida que recebi do Estado, pois em Limeira, tudo que puderam fazer para que eu estivesse fora do processo, foi feito - São Paulo garantiu que não me acontecessem coisas piores. No desempenho de minhas funções enquanto vereadora, tentei servir ao povo de Limeira da melhor forma que pude dentro das condições encontradas. Agi com ética, responsabilidade e seriedade, respeitando o interesse público em cada um de meus atos e paguei preços elevadíssimos por me colocar contra a estrutura de poder da forma como está posta. Cumpro meu mandato com a consciência tranquila não só por ter exercido meu melhor, mas por não ter sido omissa. Acredito demais na pluralidade e na democracia. Acredito que ainda viveremos tempos melhores, mas, por ora, encerro parafraseando Martin Luther King: “O que me preocupa não é o grito dos maus, mas o silêncio dos bons”.

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