O Relógio Democrático do Século XVII

Artigos
Ferramentas
TIPOGRAFIA

Houve a destruição de um relógio de parede de inestimável valor no Palacio do Planalto, trazido ao Brasil por Dom João VI em 1808, que quando funcionava com seu vaivém pendular, permitia-nos situarmos no tempo e no lugar através da marcação das horas, bem seja de dia, bem seja de noite.
Essa força pendular é extraordinariamente significava na história da humanidade, já que tem criado poderosos impérios, e a mesma força que os criou os afunda, os deteriora. É a força pendular do tempo.
Uma canção que viraliza, um ídolo, um time campeão, um país com uma hegemonia mundial, tudo está submetido a esse vaivém. Não tem nada que, feito pelas mãos dos homens, o tempo não destrua.
Aquilo que está oculto, o tempo o mostra; aquilo que brilha com esplendor, o tempo o apaga. O tempo sempre vence. E é assim como se processa tudo na vida: ora na economia, ora na política social, ora em qualquer peça arqueológica ou de obra monumental.
Essa peça rara de relógio, como exemplar único no mundo, desenhada por André-Charles Boulle e fabricada pelo francês Balthazar Martinot, em seu tempo de glória funcionava sob o impulso pendular. Estando avariado, em seu profundo silêncio no Palácio do Planalto, o país viu seu triste destino. A força pendular do tempo que ele indicava o destruiu sem poder detê-la. Por que, em pleno século XXI, esse relógio do século XVII estava nesse lugar? Qual o significado?
Quando a força do pêndulo atinge seu máximo extremo direito ou esquerdo, começa a ceder, iniciando o retorno a seu lado oposto em que outrora esteve; a força que está vencendo se fortalece a cada segundo, a cada instante, à medida que o relógio marca as horas.... e não tem como detê-la.
Quanto mais resistência houver, a força vencedora se fortalece ainda mais, e a força que está cedendo seu espaço esgota todos os seus recursos conquistados tentando manter-se no poder.
A velocidade com que o pêndulo se direciona de um lado e para o outro depende exclusivamente da resistência que houver para freá-lo. O reconhecimento desse jogo mecânico faz com que o pêndulo flua normalmente, passando pelo equilíbrio central e direcionando-se ao outro extremo sem sobressaltos, quer dizer, sem adiantamento ou atraso das horas. Caso contrário, se acelerará com tal magnitude que passará por cima do “centrão” ficando este como simples expectador do desenrolar dos acontecimentos.
A resistência, ao esticar a corda em seu máximo extremo, põe em perigo todo o sistema, toda a mecânica do relógio democrático, que, como tal, dá a mesma hora para ambas forças; tanto da direita quanto da esquerda.
A corda tem que saber soltar para que possam fluir as horas do dia ao término do jogo democrático. Quanto mais se estica a corda, pior será, porque ela pode se arrebentar; ela é uma corda! E para que não aconteça essa ruptura democrática, depende unicamente da qualidade do material do qual foi feita, e esse material se encontra nas bases da Constituição Federal que rege uma nação.
Ao arrebentar-se a corda, o relógio para de dar as horas, perdemos o norte; o pêndulo para de funcionar, não saberemos se é de dia ou de noite e nos submeteremos aos caprichos de quem ficou com o relógio quebrado, que em forma ditatorial, nos diria se é de dia ou de noite, e não poderíamos contestar, porque simplesmente não veríamos que horas são na realidade.
Está mais que demonstrado que os extremos se tocam sutilmente; o gelo seco, por exemplo, que em nossas mãos representa a sensação do máximo frio, se as fecharmos, nos queimaria.
Toda força pendular quando se quer manter em seu máximo extremo, pretende intrinsicamente romper com o sistema do qual participou para chegar ao poder, através da radicalização de seu sistema, bem seja de extrema direita ou da extrema esquerda, e para que isso aconteça, o toque sutil do “gelo seco”, numa espécie de delírio coletivo, manipulados pela força emocional de achar que seu extremismo é a única força que deve existir, faz queimar o funcionamento do jogo da mecânica do relógio democrático.
Há um fato corriqueiro em todo evento esportivo em que o derrotado estende sua mão ao vencedor, em sinal de respeito e reconhecimento às regras às quais se submeteu para fazer a disputa reconhecendo sua derrota.
Reconhecer a derrota não significa ficar fora de um torneio, o jogo continua. E que o Brasil possa vencer seus grandes desafios de pobreza, de desigualdade, de educação, independente da força que esteja na sua vez, restaurando seu relógio de parede.

 

José C. Millano Romero

Professor de espanhol e escritor humanista

No Internet Connection