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Senta, que lá vem a história

Queridos leitores, essa não é a primeira vez que conto algumas histórias que ouço em meu consultório. Gosto de compartilhá-las porque são verdadeiras e podem ser a história que alguns de vocês estejam precisando ouvir. Hoje vou falar sobre a Dona Elza e o banco da praça, uma história de reencontro com a vida. 


Dona Elza tem 82 anos. Viúva há sete anos, ela vive sozinha numa casa antiga, cheia de memórias e silêncio. Os filhos mudaram para longe, os netos cresceram e, com o passar do tempo, as visitas foram ficando cada vez mais raras. 


As paredes da casa guardam fotos amareladas, mas o coração dela sentia falta de algo muito maior: companhia. Na última consulta, ela entrou no meu consultório com os olhos baixos e o rosto marcado por uma tristeza que não se mede em exames. Com voz frágil, disse: Doutor, não sei mais para que acordo todos os dias. Fico horas olhando pela janela, só com a televisão para fazer companhia. Às vezes, sinto que estou sumindo. 


Conhecendo bem Dona Elza, sabia que ela precisava de mais do que remédios. Precisava de afeto, precisava ser vista. Perguntei a ela: Dona Elza, o que a senhora sente mais falta? Depois de um silêncio longo e um suspiro cansado, respondeu: De gente. De ouvir risadas, um “bom dia”, um abraço apertado. De sentir que ainda faço parte de algo. 


Um silêncio perturbador tomou conta do consultório. 


Recostei na poltrona e pensei o que dizer afinal, precisava passar conhecimento e segurança. Então, sugeri algo simples: Que tal a senhora tentar ir na praça perto da sua casa? Já estive em sua casa algumas vezes e conhecia o bairro. Sentar-se ao banco, observar as pessoas, levar seu crochê ou um livro. Talvez encontre alguém para conversar. Ela ficou hesitante, com medo da rejeição, do silêncio e da invisibilidade ainda maior. Mas decidiu tentar.

Passadas algumas semanas percebi que ela voltou diferente, com um sorriso tímido, mas verdadeiro. Doutor, não imaginei que um banco pudesse mudar a minha vida. Conheci a dona Palmira, que também estava sozinha e morava no mesmo bairro. Começamos a conversar e rir juntas. Quanta coisa a gente tinha em comum. Depois, veio um senhor que sempre jogava dama lá e até uma jovem que passeia com seu cachorro se juntou a nós. Agora, a praça é meu lugar. 


Dona Elza começou a fazer pão outra vez para compartilhar com os novos amigos do banco e acabou até me presenteando com um também. Percebi que passou a se sentir útil e sua alegria era contagiante. Disse que voltou a fazer planos, como reformar a casa e fazer um novo jardim. Ela não só encontrou amigos, mas reencontrou o seu próprio valor. Voltou a levantar da cama com vontade, voltou a sorrir. Sua solidão se transformou em uma rede de carinho e troca de generosidade.


Mas, o mais importante de tudo, ela me disse:


Doutor, a mudança só aconteceu porque eu quis. Porque eu decidi dar um passo, mesmo com medo. Sem querer, ninguém muda. Uma lição para todos nós. A história da Dona Elza nos mostra que a cura para muitos males não está em frascos ou receitas, mas em algo simples e humano: conexão e, acima de tudo, na vontade de querer mudar, de querer viver. 

Na vida do idoso, mais do que nunca, é fundamental sentir-se parte, ser ouvido e amado, mas também é essencial ser protagonista da própria história. Que possamos todos aprender com a Dona Elza que nunca é tarde para recomeçar, para abrir a porta e deixar a vida entrar porque no banco da praça, no sorriso de um amigo, está a verdadeira medicina para a alma. 

Precisamos ver a vida com a alma e não apenas com os olhos ou sob o ângulo das recordações passadas. Lembrei-me daquela música: “Na mesma praça, no mesmo banco, as mesmas flores e o mesmo jardim. Tudo é igual, mas estou triste porque não tenho você perto de mim”. Fiquei cantarolando essa música o dia inteiro. O autor é Carlos Eduardo Corte Imperial. Recomendo começarem a semana ouvindo essa música. Acho que ela pode vai ajudar a ligar a chavinha do "on" em suas vidas. Tenham todos uma boa semana.

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