
Ambivalência materna: como acolher esse sentimento
Sentir amor profundo e, ao mesmo tempo, vontade de sumir.
Querer cuidar e, no minuto seguinte, sentir-se exausta ao ponto de chorar.
Esses contrastes emocionais vividos por muitas mães têm nome: ambivalência
materna. De acordo com a psicóloga perinatal Rafaela Schiavo, fundadora do
Instituto MaterOnline, esse não é um sintoma a ser corrigido, mas um processo
psíquico que precisa ser escutado, nomeado e acolhido, sem julgamento.
"Quando uma mãe diz que queria desaparecer, ela não
está dizendo que não ama. Ela está tentando sobreviver", afirma
Rafaela. Ainda segundo a psicóloga, o
sentimento ainda carrega muito tabu, mas é mais comum do que se fala e pode
afetar a saúde mental da mulher caso seja silenciado. Confira o que é a
ambivalência materna, como ela se manifesta e o que a psicologia perinatal
orienta:
O que é ambivalência
materna?
É o conflito interno entre sentimentos opostos: amor e
raiva, cuidado e vontade de fugir, gratidão e exaustão. Não significa rejeição
ao bebê, e sim sobrecarga física, emocional e psíquica, especialmente nos
primeiros meses após o parto. Pode surgir desde os primeiros dias após o parto
e durar semanas ou meses, especialmente quando a mulher não tem rede de apoio
adequada. É mais comum do que se imagina uma mãe não sentir amor imediato ao
olhar para o filho recém-nascido. Para ela, aquela criança pode parecer um
estranho, e é natural que o amor leve tempo para surgir. Bebês pequenos não
interagem, não retribuem. Eles apenas demandam. O amor é uma construção. E não
sentir isso de forma imediata não faz de ninguém uma má mãe, mas sim uma mulher
em busca de equilíbrio emocional.
Cite alguns exemplos.
Quais frases que podem indicar ambivalência emocional?
- “Eu amo meu bebê, mas às vezes queria desaparecer”.
- “Queria poder dormir uma noite inteira sem culpa”.
- “Não me reconheço mais como pessoa”.
- “Sinto raiva, mas me culpo por isso”.
- “Sinto culpa por não estar feliz o tempo todo”
- “Queria sumir, mas me culpo só por pensar nisso”
De acordo com Rafaela Schiavo, esses relatos não devem ser
julgados.São pedidos de ajuda. E precisam ser acolhidos.
Por que esse
sentimento acontece?
São diversos fatores: privação de sono e cansaço extremo;
alterações hormonais e emocionais do pós-parto; idealização da maternidade e
invisibilização da mulher; falta de apoio prático e emocional; imposição de que
“instinto materno” é algo natural e automático e pressões sociais sobre o que é
“ser uma boa mãe”.
Como acolher esse
sentimento?
Nomeie o que sente. Falar é o primeiro passo para se cuidar.
Evite se julgar. Sentir raiva, tristeza ou vontade de fugir não cancela o amor.
Busque espaços de escuta com profissionais que compreendem a saúde mental
materna. Se você convive com uma mãe que expressa esse tipo de sentimento, não
minimize. Ajude com acolhimento e praticidade, não com críticas. Casos mais
intensos ou prolongados podem evoluir para depressão ou burnout materno e devem
ser acompanhados por psicólogos ou psiquiatras.
É possível prevenir?
O foco não deve estar em “evitar” esse sentimento, mas em
garantir que ele possa existir com amparo e escuta. Políticas públicas como
licença-maternidade adequada, rede de apoio e acesso à psicoterapia perinatal
são fundamentais para a saúde mental das mulheres. A maternidade exige muito,
física e emocionalmente. Negar essa complexidade só aprofunda o sofrimento.
Quando a escuta chega antes do adoecimento, ela pode mudar tudo.
Quem é Rafaela
Schiavo?
É psicóloga perinatal e fundadora do Instituto MaterOnline. Desde sua formação inicial, dedica-se à saúde mental materna, sendo autora de centenas de trabalhos científicos com o objetivo de reduzir as elevadas taxas de alterações emocionais maternas no Brasil. Possui graduação em Licenciatura Plena em Psicologia e graduação em Psicologia pela Universidade Estadual Paulista Júlio de Mesquita Filho. Além disso, concluiu seu mestrado em Psicologia do Desenvolvimento e Aprendizagem e doutorado em Saúde Coletiva pela mesma instituição. Realizou seu pós-doutorado na UNESP/Bauru, integrando o Programa de Psicologia do Desenvolvimento e Aprendizagem. Tem experiência na área de Psicologia, com ênfase em Desenvolvimento Humano, atuando principalmente nos seguintes temas: desenvolvimento pré-natal e na primeira infância.
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