
SP comemora os 40 anos de criação da 1ª Delegacia da Mulher
Em três anos, cerca de 100 Salas DDM de atendimento especializado 24 horas foram criadas no Estado; Limeira foi a primeira cidade do interior paulista a receber a novidade
Em 6 de agosto de 1985, antes mesmo da criação da Lei Maria da Penha, São Paulo inaugurou a primeira Delegacia de Defesa da Mulher (DDM) do mundo. Entre mudanças na lei, experiências adquiridas durante os atendimentos, criações de políticas públicas, implementação de novas tecnologias e adaptações, a unidade tornou-se símbolo de expansão e evolução nas ações de combate à violência contra a mulher.
Atualmente, o estado conta com 164 salas de atendimento especializado em todo o território paulista — cem delas criadas na atual gestão —, além das unidades territoriais para estimular as denúncias e combater a subnotificação. O objetivo foi o de expandir o serviço para as cidades do interior que não contavam com equipe especializada. A DDM de Limeira é tida como a primeira do interior do estado, instalada em 1987.
No entanto, há 40 anos, 13 mulheres, entre delegadas, escrivães, investigadoras, carcereiras e assistentes de telecomunicações eram responsáveis pelos atendimentos. Só no primeiro mês de funcionamento, mais de dois mil boletins de ocorrência foram registrados, sendo a maioria por violência doméstica e abuso sexual. No ano passado, foram registrados por mês cerca de 16 mil boletins de ocorrência de violência doméstica em todo o estado.
Essas denúncias jogaram ainda mais luz no problema, que não podia ser combatido apenas com os registros feitos na delegacia ou intimações aos agressores. Pouco tempo depois, psicólogas, assistentes sociais e até representantes da Ordem dos Advogados do Brasil (OAB) juntaram-se, como voluntárias, às equipes da DDM, para oferecer um apoio multissetorial às vítimas.
Sem exemplos e procedimentos pré-definidos e até mesmo sem leis que assegurassem as vítimas, as policiais que trabalhavam na 1ª delegacia faziam “malabarismos” para garantir a segurança delas. Foi assim que a primeira Delegacia da Mulher tornou-se o “pontapé” para criações de políticas públicas de proteção às mulheres em todo o Brasil.
“Foi com base no que extraímos lá que fomos aprimorando os nossos serviços e atendimentos. A delegacia fez história por revolucionar as ações de combate a esse crime tão sério que, antes, era pouco falado”, avaliou a delegada Rosmary Corrêa. Foi ela quem assumiu o comando da DDM entre 1985 e 1989, quando recebeu a missão de coordenar todas as unidades que foram abertas posteriormente no estado.
Agora, 40 anos depois, o território paulista conta com 142 DDMs físicas que representam apenas a materialidade do que realmente é feito pelos policiais civis que atuam nas unidades. Além do atendimento especializado, eles oferecem apoio e ajuda — até mesmo psicossocial — para que as vítimas consigam superar os traumas e reconstruir suas vidas. O uso da tornozeleira eletrônica por agressores soltos em audiência de custódia foi outra ferramenta essencial para proteger as mulheres vítimas de violência. O projeto pioneiro, que começou na capital paulista, será expandindo gradualmente para todo o estado.
O que motivou a criação da DDM?
Nos anos 1980, foi instalado no governo paulista o primeiro Conselho Estadual da Condição Feminina. Uma das principais reclamações do grupo era sobre os atendimentos nas delegacias comuns, feitos majoritariamente por homens. O receio de não receber o devido apoio e ainda piorar a situação em casa fazia com que as mulheres não denunciassem os agressores. Foi daí que surgiu a ideia da unidade especializada, com atendimento totalmente feminino.
Para a primeira delegada da unidade, a DDM mostrou as verdadeiras tragédias — até então praticamente ocultas — que ocorriam dentro de casa. “A gente mudou aquele jargão que dizia 'briga de marido e mulher não se mete a colher' para um novo: 'Briga de marido e mulher, se mete a polícia'”, disse.
Logo em 1986, a DDM foi consolidada como política pública estadual, com a promulgação da Lei nº 5.467, que determinou a implantação dessas unidades em Delegacias Seccionais da Grande São Paulo, Delegacias Regionais do Interior e em outras localidades estratégicas.
Atual coordenadora das DDMs, a delegada Adriana Liporoni, avaliou que hoje as unidades vão além das funções estritamente jurídicas e “se tornaram espaços de escuta ativa, orientação, acolhimento e articulação com outros serviços de rede, fundamentais na efetivação de políticas públicas voltadas à mulher”.
Desafios e prioridades
Os desafios para tratar da problemática são inúmeros porque englobam desde fatores sociais até culturais e, apesar de ainda haver a necessidade de adequações, a evolução das ações de combate à violência de gênero é notória.
Um dos principais problemas, ainda segundo Liporoni, é a subnotificação. Por isso, o governo de São Paulo tem investido no fortalecimento de toda a rede de apoio e constantemente em campanhas para incentivar as denúncias.
Além disso, a inauguração de novas Delegacias de Defesa da Mulher para cobrir todas as regiões do estado e os recursos tecnológicos usados para facilitar ainda mais o acesso dessas vítimas à polícia também fazem parte do pacote contra o crime.
O aplicativo SP Mulher Segura, que conta com um botão do pânico e permite o registro do boletim de ocorrência virtualmente, além das 164 Salas DDMs 24 horas instaladas em plantões policiais, que oferecem esse atendimento especializado, são exemplos disso.
Conscientização
Apesar das evoluções com mecanismos de denúncia, delegacias especializadas, criação de abrigos, maior facilidade para vítimas adquirirem imóveis próprios, incentivo ao empreendedorismo e outras ações, a conscientização sobre o tema ainda é uma das principais formas de combater o crime.
A avaliação foi feita pela delegada Jamila Jorge Ferrari. Hoje ela é responsável pelo Departamento de Polícia Judiciária da Macro São Paulo (Demacro), mas os cinco anos como coordenadora das DDMs, além de diversos estudos sobre o tema, a fez ter essa certeza.
Segundo ela, ler os boletins de ocorrência de casos de feminicídio a deixava impactada porque “era ódio sem precedentes porque, na maioria das vezes, o homem se achava superior”.
“A conscientização é mais fácil quando fazemos desde a infância. O tema precisa ser debatido com os nossos meninos e adolescentes, seja em casa ou na escola. Eles precisam ter a consciência que somos todos iguais e temos os mesmos direitos”, opinou.
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