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Gazeta de Limeira
19/09/2025

Do alerta à exaustão: quando o estresse passa a adoecer
Por Ramon Marcelino, médico endocrinologista do Hospital das Clínicas da Faculdade de Medicina da USP (HC-FMUSP).
Trânsito, contas, prazos apertados, excesso de trabalho. Essa combinação já faz parte da rotina de grande parte da população. Mas qual é o limite do estresse diário? E o que acontece quando esse limite é ultrapassado? O Dia Mundial de Combate ao Estresse, celebrado em 23 de setembro, é um convite à reflexão sobre como lidamos com esse fenômeno tão presente na vida moderna.
Embora frequentemente visto como um vilão, o estresse teve papel essencial na evolução humana. A resposta fisiológica desencadeada por situações de ameaça, como o aumento do cortisol, da adrenalina e dos batimentos cardíacos, foi determinante para a sobrevivência de nossos ancestrais. Diante de um predador, como um leão, essa descarga hormonal permitia reagir com rapidez, seja para lutar, seja para fugir.
O problema surge quando esse mesmo mecanismo é acionado de forma repetida em situações cotidianas, como enfrentar o trânsito ou cumprir prazos de trabalho. O estresse ocupacional, associado ao trabalho aumenta em 40% o risco cardiovascular. Além disso, o estresse crônico aumenta o risco de diabetes e depressão.
No ambiente profissional, o impacto é ainda mais alarmante. Um levantamento da International Stress Management Association (ISMA-BR) mostra que 72% dos brasileiros estão estressados no trabalho e 32% já desenvolveram a síndrome de burnout, reconhecida pela OMS como um fenômeno ocupacional.
É claro que não basta simplesmente "mandar alguém relaxar". O manejo do estresse requer mudanças concretas na forma como nos relacionamos com ele. É anedótico quando a política da empresa de combate ao estresse se resume a ginástica laboral uma vez ao ano.
A medicina do estilo de vida propõe estratégias como a prática regular de atividade física prazerosa, momentos de lazer, meditação e fortalecimento de vínculos sociais.
Em alguns casos, no entanto, essas medidas não são suficientes. É ai que a transição de carreira pode se tornar uma saída. Estudos apontam que mudanças de função, setor ou até mesmo de área profissional podem reduzir os efeitos do burnout, sobretudo a exaustão emocional e a despersonalização. Esse processo é mais efetivo quando acompanhado de planejamento, suporte social e da construção de uma nova identidade profissional.
Buscar atividades que tenham propósito, significado e tragam satisfação pessoal contribui para maior resiliência e reduz as chances de recaída em quadros de estresse patológico. Reinventar-se nunca é tarde.
No Dia Mundial de Combate ao Estresse, a reflexão que fica é: não se trata de eliminar o estresse da vida, algo impossível, mas de escolher de que forma vamos nos relacionar com ele. Que o estresse que carregamos seja aquele que nasce do propósito, do orgulho em nossas escolhas e da satisfação pessoal e profissional.
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