
Jovens não rejeitam a CLT. Rejeitam salários baixos e exploração
Enquanto milhões buscam alternativas informais, a Previdência e os direitos trabalhistas sofrem as consequências da precarização do trabalho.
Não é a carteira assinada que os jovens estão rejeitando. É a precariedade do emprego formal que os afasta. Salários baixos, jornadas exaustivas e a ausência de direitos que garantam dignidade e qualidade de vida estão empurrando trabalhadores para o regime PJ ou MEI, não por escolha, mas por necessidade.
Dados recentes reforçam essa tendência. Um levantamento do Datafolha indica que 59% dos brasileiros preferem trabalhar por conta própria, ante 39% que se sentem mais confortáveis como empregados de empresas. Desde 2022, cresceu de 21% para 31% o número de pessoas que consideram mais importante ganhar mais do que ter registro formal. Pesquisa do Instituto Locomotiva, com 1.503 paulistas entre 18 e 59 anos, mostra que 63% consideram o trabalho formal pouco flexível para conciliar vida pessoal e profissional, e 58% escolheriam trabalhar por conta própria se pudessem.
Em São Paulo, por exemplo, uma alimentação adequada custa cerca de R$ 800 por mês — praticamente metade do salário líquido de trabalhadores que recebem R$ 1.700. Diante dessa realidade, abrir MEI ou aceitar trabalho como PJ muitas vezes é a única saída para complementar a renda.
O impacto é grave: a migração para a informalidade fragiliza a Previdência Social, enfraquece os direitos trabalhistas e precariza toda a classe trabalhadora. Em 2024, 38,8% da população ocupada no país — cerca de 40 milhões de trabalhadores — está sem vínculo formal, e no setor privado, 26,6% trabalham sem carteira assinada.
Além disso, práticas abusivas como o banco de horas sobrecarregam os trabalhadores. Embora a CLT estabeleça que as horas extras devem ser compensadas em até 12 meses, relatos de funcionários de lojas de varejo e supermercados mostram que jornadas diárias chegam a dez ou doze horas sem pagamento adicional, e folgas prometidas nunca são concedidas. Muitos trabalhadores ainda acumulam empregos para complementar a renda, trabalhando à noite como motoristas de aplicativo ou em outros bicos, sacrificando saúde, lazer e vida familiar.
Essa realidade deixa claro: o que está sendo rejeitado não é a CLT, mas a exploração disfarçada de formalidade. Com salários dignos, jornada justa e direitos respeitados, nenhum trabalhador abriria mão da carteira assinada.
Neste cenário, o papel dos sindicatos é fundamental. Eles defendem os direitos, negociam melhores salários e condições de trabalho, e garantem que a formalidade seja realmente sinônimo de proteção e dignidade. Fortalecer a CLT e os sindicatos é proteger a classe trabalhadora, assegurar a Previdência Social e garantir que o trabalho no Brasil seja justo e valorizado.
* Lourival Figueiredo Melo é presidente da Feaac (Federação dos
Empregados de Agentes Autônomos do Comércio de São Paulo) e
secretário-geral da CNTC (Confederação Nacional dos Trabalhadores no
Comércio)
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