“Falta interesse político para autismo em Limeira”

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José Milton Rodrigues de Melo é um dos grandes nomes da causa de conscientização e da luta de direito pelas pessoas com autismo em Limeira. Ele compartilhou sua jornada pessoal e familiar ao lidar com o Transtorno do Espectro Autista (TEA) de seu filho, Samuel, e as dificuldades enfrentadas ao longo do caminho. A partir dessa experiência, em 2019, o pai fundou o Grupo Inclusão Já, que hoje conta com mais de 380 membros. O grupo visa promover a inclusão de pessoas com TEA em vários aspectos da vida, incluindo família, educação e saúde. Estratégias como treinamento parental e defesa de projetos de lei específicos têm sido defendidas para melhorar a qualidade de vida dessas pessoas e suas famílias em Limeira. No entanto, apesar dos esforços do grupo, muitos obstáculos persistem. A falta de interesse político e a burocracia têm dificultado a implementação de políticas públicas eficazes. A educação inclusiva e o acesso adequado à saúde continuam sendo desafios significativos. A comunidade é incentivada a se envolver e apoiar iniciativas que visam garantir direitos e serviços para pessoas com autismo em Limeira. Em meio ao "Abril Azul" de conscientização sobre o autismo, a Gazeta traz uma entrevista reveladora sobre os desafios enfrentados e a escassez do atendimento no CEMA (Centro de Especialização Municipal do Autista).

 

Confira:

 

Como pai de um filho com Transtorno do Espectro Autista (TEA), qual foi a sua jornada pessoal e familiar ao lidar com o diagnóstico e os desafios associados ao autismo?

Quando adotamos o Samuel, ele tinha 2 anos de idade, no dia 29 de abril irá fazer 15 anos. Naquele momento não tínhamos as informações que temos hoje, mesmo assim procuro sempre estar me atualizando, pois todo o tempo surgem novas informações.

Para minha família foi muito desafiador, mas sabendo da condição dele, começamos a procurar por tratamento, o que nos ajudou muito, além de outros serviços que na época em São Vicente, local de onde viemos em dezembro de 2016, foi na APAE que encontramos um local de extrema importância, pois ele participava do Projeto TEA no contra turno da escola por um período de 4 horas e também estudava em uma escola que tinha uma classe especial com 9 alunos e ficava durante todo período sem que alguém da escola ligasse chamando pra ir buscá-lo pelo motivo dele estar apresentando algum comportamento disruptivo, muito pelo contrário, quando falei pra professora que na época cuidava dele que poderia me chamar caso houvesse alguma necessidade, ela simplesmente me falou que eles é quem deveriam procurar manter o Samuel na escola e nunca ligaram pra ir buscá-lo.

Quando chegamos em Limeira, foi para minha família um choque de realidade, tanto que o que ela sabe hoje, é o que aprendeu naquela época, literalmente percebermos que ele estacionou em relação a escola e a autonomia, justamente por que aqui não houve a continuidade no processo do desenvolvimento, tanto na educação, quanto na saúde faltou estímulo. Por conta dessa situação, e o serviço público em Limeira não oferecendo o atendimento que ele precisa, foi necessário ser internado em uma clínica especializada em autismo em outra cidade da nossa região.

Conhecendo as potencialidades que ele apresentava entes de chegar aqui, começou toda essa minha trajetória desde 2017 para buscar o atendimento adequado e necessário para meu filho, que hoje não é mais somente para ele, mas por todos os "Samueis" que estão e virão e esse é o trabalho que desenvolvemos através do Grupo Inclusão Já.

 

Poderia compartilhar algumas das iniciativas e atividades promovidas pelo grupo Inclusão Já em Limeira para conscientizar e apoiar pessoas com autismo e suas famílias?

 

O Grupo Inclusão Já, grupo de apoio formado por pais, familiares, cuidadores amigos de pessoas autistas de Limeira conta com mais de 380 participantes e começou em 2019. O objetivo é propor a inclusão de pessoas com TEA no ambiente familiar, inclusão escolar, inclusão na sociedade e acesso aos serviços de saúde públicos e privados. A inclusão é desenvolvida através do tripé formado pela família, educação e saúde com o objetivo de alcançar a autonomia e o pleno desenvolvimento dessas pessoas.

 

Como você avalia o nível de inclusão e acessibilidade para pessoas com autismo em Limeira? Quais são as principais áreas que ainda necessitam de melhorias em termos de apoio e suporte?

Muitas coisas precisam ser feitas para garantir uma inclusão de verdade. Em relação a escola não é apenas que o aluno esteja matriculado, é necessário que ele permaneça, participe e aprenda.

Em relação a saúde, estamos muito aquém daquilo que deveríamos estar, pois 30 minutos 1 vez por semana não representa absolutamente nada para os pacientes nos 3 níveis de suporte nas idades 3 a 30 anos. Em relação as famílias, quem cuida também precisa de cuidados, por esse motivo é de fundamental importância o treinamento parental para o desenvolvimento das habilidades no manejo do comportamento e habilidades dos filhos em ambientes naturais e a educação parental, para que as famílias consigam resignificar os desafios que lhes são impostos e muito intenso.

 

No contexto educacional, quais são as estratégias defendidas pelo grupo Inclusão Já para garantir uma educação inclusiva e de qualidade para crianças e jovens com autismo na cidade?

Queremos a aprovação do Projeto de Lei 71/23 que

"Institui as diretrizes municipais de educação especial para pessoas com o transtorno do espectro do autismo" de autoria do professor Lucelmo Lacerda, entregue no dia 22 de maio de 2023 na Câmara Municipal de Limeira para às comissões. Esse PL já passou por todas as comissões e está aguardando ser indicado pelos vereadores para votação.

 

Como você enxerga o papel das autoridades municipais e da sociedade civil na promoção dos direitos e na melhoria da qualidade de vida das pessoas com autismo em Limeira?

Desde 2017 tenho levado demandas e apresentando propostas para a melhoria da qualidade de vida das pessoas com TEA e seus familiares. Percebo que não há interesse político para implementação de políticas públicas, tudo é muito lento e muito burocrático e nossos projetos acabam não acontecendo. Um exemplo disso é o CEMA que estamos aguardando as autoridades ampliarem a capacidade de atendimento e a informação que termos é que isso somente será realizado no final de 2024. Para esse ano, por tudo que já passamos, até o final desse governo, as coisas não mudarão, por isso entendo que o próximo governo deve se debruçar de maneira séria, responsável e humana. As pessoas com TEA devem ser vistas como prioridade e não serem relegadas como tem sido feito até agora. No ano de 2022 ocorreu o atendimento de 8 pacientes com TEA por parte da Municipalidade através de processos de judicialização para internações ou terapias ambulatoriais com o custo de R$762.267,89 para cumprimento dessas ações. Se somar os valores que foram pagos com judicialização desde 2017, já teríamos um atendimento de excelência.

 

Sabemos que o autismo afeta cada indivíduo de maneira única. Quais são os principais desafios enfrentados pelo grupo Inclusão Já? Como a comunidade pode contribuir para superar esses desafios?

Precisamos continuar lutando pela garantia de direitos dessas pessoas, hoje em Limeira disponibilizamos de inúmeras clínicas que possuem profissionais e o tratamento que essas pessoas precisam, e se o governo não tem para oferecer somente resta aos responsáveis buscar através de judicialização esses serviços.

Até o meio do ano estaremos criando a Associação Inclusão Já e a sociedade pode nos ajudar para darmos o suporte jurídico, visando garantir o atendimento clínico e escolar.

 

Quais são os seus sonhos e expectativas para o futuro das pessoas com autismo em Limeira? Como você imagina a cidade daqui a alguns anos em termos de inclusão e apoio às pessoas com TEA?

Antes de 2017 o CEMA era referência no atendimento de autistas no Brasil. Durante esses últimos anos temos visto os atendimentos sendo cada vez mais reduzido. Por conta da demanda que está crescendo ininterruptamente, foi reduzido o tempo de atendimento para abrir vagas para os novos pacientes, o que antes já era pouco focou ainda menor. Nosso desejo é que o CEMA volte ao patamar de onde nunca deveria ter saído.

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