Consumo de alimentos mais saudáveis aumentou na pandemia

Local
Ferramentas
TIPOGRAFIA

Pesquisadora do NutriNet Brasil, Eurídice Martínez Steele, diz que população consumiu mais frutas, hortaliças e feijão

Apesar do ganho de peso ser uma queixa comum durante a pandemia, um estudo, coordenado pelo Núcleo de Pesquisas Epidemiológicas em Nutrição e Saúde (Nupens) da Faculdade de Saúde Pública (FSP) da Universidade de São Paulo (USP), indica um fator positivo nos hábitos alimentares do brasileiro.
Os primeiros resultados do estudo NutriNet Brasil apontam aumento no consumo de frutas, hortaliças e feijão durante a pandemia. A pesquisa, iniciada em janeiro de 2020, tem objetivo de identificar os principais padrões de alimentação praticados pelos brasileiros e estudar sua associação com o risco de desenvolver doenças crônicas não transmissíveis. Os resultados vão contribuir para a elaboração de políticas públicas que promovam a saúde e a qualidade de vida da população.
A pesquisadora do NutriNet Brasil e pós-doutoranda no Nupens/USP, Eurídice Martínez Steele, falou à Gazeta sobre a pesquisa, que seguirá por 10 anos.

Qual foi o objetivo deste estudo?
O objetivo do Estudo NutriNet Brasil é identificar os principais padrões alimentares praticados pela população do estudo e analisar a relação desses padrões com o risco de doenças crônicas não transmissíveis, como obesidade, diabetes, hipertensão, colesterol elevado, doenças cardiovasculares e vários tipos de câncer.
A partir de uma amostra inicial com as respostas dos 10 mil primeiros participantes, que responderam a pesquisa em dois momentos: entre 26 de janeiro e 15 de fevereiro (antes da pandemia) e entre 10 e 19 de maio (durante a pandemia), foi possível comparar o comportamento alimentar dos voluntários antes e durante a pandemia do coronavírus no Brasil.

O resultado foi uma surpresa, considerando que o brasileiro ainda tem maus hábitos alimentares?
Os resultados iniciais do NutriNet Brasil apontaram um aumento generalizado na frequência de consumo de frutas, hortaliças e feijão (de 40,2% para 44,6%) durante a pandemia. Então, foi uma surpresa já que é razoável esperar que a maior permanência das pessoas em suas residências, aliada ao fechamento de bares e restaurantes, por exemplo, aumente a frequência de refeições feitas em casa, que, no geral, tendem a ser mais saudáveis do que as consumidas na rua. Além disso, uma maior preocupação em consumir alimentos mais saudáveis como forma de aumentar as defesas imunológicas também poderia explicar uma melhora na alimentação nesse período. 
Por outro lado, ainda com base no estudo, a evolução positiva na alimentação foi acompanhada por um aumento no consumo de alimentos ultraprocessados nas regiões Norte e Nordeste e também entre as pessoas de escolaridade mais baixa. Esses resultados sugerem desigualdades sociais na resposta do comportamento alimentar à pandemia. Isso poderia ser explicado pela maior dificuldade de acesso a alimentos frescos, cuja aquisição demanda saídas mais frequentes de casa, além da eventual redução na renda familiar por perda de emprego, limitando a compra de alimentos de maior preço, como são frutas e hortaliças.

Uma boa alimentação pode ser o diferencial no enfrentamento a covid?
Sim, já que a alimentação tem influência sobre o desenvolvimento de doenças crônicas não transmissíveis, como obesidade, hipertensão e diabetes, as quais, já se sabe, aumentam a gravidade e a letalidade da covid-19. Além, claro, de contribuir para o aumento das defesas imunológicas do organismo.

A partir deste estudo, o que se pode concluir?
O que mais preocupa é o aumento no consumo de alimentos ultraprocessados nas regiões economicamente menos desenvolvidas e por pessoas com menor escolaridade, pois a ingestão desses alimentos eleva o risco de doenças crônicas não transmissíveis, como obesidade, hipertensão e diabetes, que, por sua vez, aumentam a gravidade e a letalidade da covid-19. Por se tratar de um estudo longo, será possível acompanhar a evolução disso.

Como foi o desenvolvimento da pesquisa?
O Estudo NutriNet Brasil, iniciado em janeiro deste ano, terá duração de 10 anos. Até o momento, temos 80 mil inscritos e o objetivo é chegar a 200 mil participantes em dois anos. Podem participar pessoas residentes no país, com idade mínima de 18 anos e que tenham acesso à internet (via celular ou computador).
Os questionários são preenchidos por meio da plataforma digital: https://nutrinetbrasil.fsp.usp.br, que pode ser acessada pelo celular ou pelo computador. O interessado precisa realizar um cadastro e responder ao questionário inicial do estudo, que leva cerca de 5 minutos. Notificações por e-mail ou SMS avisarão quando novos formulários estiverem disponíveis para preenchimento.

O que o estudo NutriNet Brasil pretende fazer com os dados colhidos?
Como mencionado anteriormente, o Estudo NutriNet Brasil irá identificar os padrões de alimentação efetivamente praticados nas várias regiões do Brasil e desvendar a relação desses padrões com o risco de obesidade, diabetes, doenças do coração, câncer e outras doenças crônicas não transmissíveis que afetam milhões de brasileiros.
Dentro de dois a três anos, talvez já seja possível investigar a relação entre os padrões de alimentação encontrados no estudo com doenças como diabetes e obesidade, por exemplo. Para analisar a ligação desses comportamentos com diferentes tipos de câncer, precisaremos de mais tempo, uma média de oito anos.
Com os dados obtidos ao final do estudo, teremos evidências científicas que ajudarão a criar políticas públicas que contribuam com a saúde da população, assim como com a qualidade do que se consome e com a redução do risco de doenças. Por meio do nosso trabalho, dos estudos científicos, criamos evidências importantes para interferir e subsidiar essas políticas públicas.

Já desenvolvem outras pesquisas?
O Estudo NutriNet Brasil é coordenado pelo Núcleo de Pesquisas Epidemiológicas em Nutrição e Saúde (Nupens) da Faculdade de Saúde Pública (FSP) da Universidade de São Paulo (USP). O Nupens/USP foi criado em 1990 com a finalidade de estimular e desenvolver pesquisas populacionais em nutrição e saúde. Conta com diversos colaboradores, já realizou dezenas de pesquisas e prestou toda a consultoria técnico-científica para embasar o Guia Alimentar para a População Brasileira (Ministério da Saúde, 2014), nossa grande referência em alimentação saudável hoje no país.

Diante do nosso atual cenário, o que diria para as pessoas com relação a alimentação?
A minha sugestão é para que as pessoas sigam as recomendações do Guia Alimentar para a População Brasileira e optem sempre por consumir alimentos in natura ou minimamente processados e prefiram preparações culinárias a alimentos ultraprocessados.



Dez passos para uma alimentação saudável:
1. fazer de alimentos in natura ou minimamente processados a base da alimentação;
2. utilizar óleos, gorduras, sal e açúcar em pequenas quantidades ao temperar e cozinhar alimentos e criar preparações culinárias;
3. limitar o consumo de alimentos processados;
4. evitar o consumo de alimentos ultraprocessados;
5. comer com regularidade e atenção, em ambientes apropriados e, sempre que possível, com companhia;
6. fazer compras em locais que ofertem variedades de alimentos in natura ou minimamente processados;
7. desenvolver, exercitar e partilhar habilidades culinárias;
8. planejar o uso do tempo para dar à alimentação o espaço que ela merece;
9. dar preferência, quando fora de casa, a locais que servem refeições feitas na hora;
10. ser crítico quanto a informações, orientações e mensagens sobre alimentação veiculadas em propagandas comerciais.

Inscreva-se gratuitamente para receber em primeira mão todas as novidades.
No Internet Connection